A grandeza de uma mulher pequena – 3º Parte
Dom Augusto César
Um desvio no caminho
Entretanto, não gostava de deixar no esquecimento, um pequeno episódio da sua meninice. Pois, numa alma assim tudo indica caminho e direção. Aparentemente, parece um capricho de criança. Mas no dizer do P. Louis-Albert (acima referido), é antes uma “audácia de amor” e um “arrebatamento do coração”. De que se trata, pois? Vou lembrar: certo dia, Maria Rivier combinou com uma amiga da mesma idade, realizar uma ‘fuga’ na direção da montanha. Tinha ouvido falar dos Padres do Deserto e da sua experiência contemplativa, e aquilo buliu-lhe com o coração e com a vontade. E, como ali perto, passava um caminho (decerto florestal) que rumava na direção da montanha, ela idealizou, assim, a aventura: levamos um pão grande e subimos até ao alto. Lá, rezamos, cantamos e contemplamos… O alto da montanha, para ela, era mais Deus do que um lugar, mesmo com horizonte alargado. E sonhava de longe, o que de perto havia de a deslumbrar.
Claro que a aventura ficou lograda: a companheira intimidou-se e ela foi trazida de volta para casa, por uma vizinha que conhecia a família e soube avaliar a fantasia da pequena. Mas o sonho das ‘alturas’, esse, nunca se desvaneceu do seu espírito!
Quer dizer, o céu era uma espécie de nostalgia do Jardim do Éden, onde se ouviam ecoar estas palavras: “façamos o homem à nossa imagem e semelhança” … e, ainda: “e viu Deus que tudo era bom”! Ora, tudo isto transparecia daquela imagem, que Maria Rivier contemplou demoradamente. Na verdade, a ternura da Mãe e a paz do Filho gravaram-se na sua alma, como se fosse a ‘assinatura’ de Deus. E ela sentiu-se encorajada e cheia de zelo apostólico, tudo voltado para os mais necessitados.
A sedução da boa nova
Daí, estas palavras suas, que eu gosto de repetir: “tudo, em nós, deve levar aqueles que nos vêm, a pensar em Jesus Cristo e a honrá-lo”. E como? Através do testemunho que damos e do Evangelho aberto e explicado, que mostramos. O Evangelho aberto recorda-nos as palavras do profeta Isaías que Jesus leu e assumiu, na Sinagoga da Sua terra: “O Espírito do Senhor está sobre Mim, porque Me ungiu, para levar a Boa Nova aos pobres… e anunciar o Reino de Deus que está próximo”. E, a partir daí, percorreu as aldeias e cidades, aproximou-se dos publicanos e pecadores, compadeceu-se dos doentes… e ensinou os discípulos a ser ‘mansos e humildes de coração’, como Ele. Ora, a partir do baptismo, também nós somos ungidos pelo Espírito e configurados espiritualmente com Cristo, a fim de ungir de caridade o mundo que nos rodeia. E esta canseira apostólica não deixava Maria Rivier sossegada, incutindo nas companheiras um zelo semelhante. Na realidade, ela sentia, como os discípulos de Emaús, um fogo que lhe ardia no coração. E donde vinha esse fogo?
E que fazer… perguntaremos nós? Pedir a Maria Rivier, neste trigésimo ano da sua beatificação, que dê luz e muita coragem apostólica às suas Filhas espirituais – as Irmãs da Apresentação de Maria; e que inspire muitas jovens a experimentar o zelo que a devorava e doação generosa que a levou à consagração. E para nós? Uma vontade decidida de testemunharmos com a vida, a fé que recebemos no batismo, tal como no-lo recordou Bento XVI, quando visitou Portugal e por nós rezou em Fátima: “Saiam à praça pública e deem, sem medo, testemunho da vossa fé”. Com efeito, se somos cristãos de verdade – e o Ano da Fé é disso um forte apelo – digamos com a vida o que somos e convidemos quem nos rodeia, a amar a Deus e ao próximo. Foi este o projeto de Maria Rivier e deve ser também o nosso.
*Fotografia tirada da Cripta, da Casa Mãe em França