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O CORAÇÃO não pode ficar CONFINADO

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Ir. Carla Barbosa, pm

Quando o mundo ainda se agita e não vê claro o que será o amanhã, quando por toda a parte se multiplicam medidas de proteção e conselhos de contenção, quando homens e mulheres procuram compreender e incansavelmente buscam um remédio para apaziguar toda a dor e insegurança que este vírus espalhou…é urgente não desfocarmos o olhar, não nos deixarmos submergir por aquilo que nos esvazia e fecha, não deixarmos o coração ficar confinado.

Coração, na bíblia, significa o centro da pessoa, a fonte da vida, o lugar de onde brotam os sentimentos e emoções, onde se amassam e levedam as decisões.

Maria Rivier dizia muitas vezes àquelas que Deus lhe confiara como irmãs: “A morada de Jesus deve ser o vosso coração.” Este convite serve também para nós hoje, independentemente da nossa idade, profissão ou vocação. Ora, se acreditamos que Jesus habita o nosso coração, não podemos duvidar que Ele queira torná-lo à semelhança do seu: aberto, disponível, generoso, atento, solidário, bom e humilde. O medo, a insegurança, a incerteza…do momento presente, podem levar-nos à tentação de vermos o outro como uma ameaça, um perigo para a minha saúde, um atentado à minha vida…e com isto, quase inconscientemente vamos “aferrolhando” o nosso coração.

Para Jesus, como também, para Maria Rivier era inconcebível deixar o coração fechado, confinado, indiferente à dor ou sofrimento dos irmãos. Jesus ao longo da sua vida terrena não cessou de tocar os corações, mesmo os mais duros, de abrir, mesmo os mais fechados, de curar, mesmo os mais feridos, até ao ponto de deixar trespassar o seu próprio coração no alto da Cruz, ficando para sempre aberta essa chaga de amor, que para uns foi confirmação de fé, para outros o ADN do Ressuscitado.

Diz a Palavra de Deus que “na tarde desse dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas do lugar onde estavam os discípulos, por medo dos judeus…”. Não eram só as portas da casa que estavam fechadas, era sobretudo o coração dos discípulos que estava confinado, porque o medo tem esse poder de fechar, isolar, impedir a vida de circular e avançar. Mas Jesus veio mesmo assim com as portas fechadas “pôs-se no meio deles e disse: «A paz esteja convosco». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos alegraram-se ao ver o Senhor” (Jo 20, 19-20).

Deste encontro algo novo nasceu, a confiança, a alegria trazida pelo seu Mestre trespassou também os seus corações e o medo dissipou-se. Sim, porque só a confiança pode destruir o medo. Foi por isso que logo a seguir Jesus os envia e eles partem a anunciar a Boa Nova. Já não há mais portas nem fechaduras que os impeçam. Isto é ter um coração desconfinado.

Outro exemplo singular para nós é a Virgem Maria. Ela que logo depois do anúncio do Anjo Gabriel, não se acomodou nem se fechou na incerteza humana do que estava por vir, mas antes “levantou-se e correu apressadamente para a montanha para ir ao encontro da sua prima Isabel” (Cf. Lc 1,39) para a ajudar, para servir, para se dar e dar Aquele que já morava nela. Isto é ter um coração desconfinado.

Tal como Maria Rivier que, em plena Revolução Francesa, quando todos se escondiam e a Igreja era perseguida, ela não se fecha nos seus limites, mesmo sendo muitos, não dá voz ao medo que possivelmente a habita, mas antes escancara o seu grande coração, porque o amor é bem maior que o medo, e vai. Avança infatigavelmente ao encontro de todos aqueles e aquelas que precisam da sua ajuda. E eram tantos, tantos…

Naquele tempo a epidemia era de outra ordem, mas a resposta desta pequena, grande mulher, foi a única esperada de alguém que se deixou habitar pela confiança nessa presença: Jesus.

Maria Rivier, como fiel discípula de Jesus, nunca teve o coração confinado.

Não será isto uma pertinente interpelação para nós hoje?

Com isto não quero dizer que percamos a prudência humana e ignoremos as leis e diretivas que buscam salvaguardar o bem-estar de todos. Muito pelo contrário. A inteligência do coração permite-nos descobrir com criatividade caminhos novos que nos aproximam, que nos unam e nos abram uns aos outros, sobretudo aos mais frágeis e vulneráveis, aos que buscam um lugar de aconchego e consolo, solidários com as suas dores e angústias. E são tantos, tantos… E há imensas pequenas e grandes maneiras de o realizamos em verdade. Basta querer e acreditar que sendo o meu coração morada de Jesus, ninguém pode ficar fora dele, não posso ficar indiferente ao outro, quem quer que ele seja ou onde quer que esteja.

E isto não tem nada a ver com a prudência dos metros que, neste momento, nos separam uns dos outros.

Ainda que eu fale todas as línguas, distribua todos os meus bens e entregue o meu corpo para ser queimado… (1Cor 13, 1-3) SE O MEU CORAÇÃO ESTIVER CONFINADO… NADA SOU.

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